AS GRANDES ETAPAS DA EVOLUÇÃO EM TRAIL

O trail running, uma história plena de primeiras vezes

É daqueles que sente cada vez mais o gosto pelo trail ou faz parte dos que se sentem assolados pela impaciência (aqueles que consultam o GPS a cada passada)? Não importa, independentemente de qual seja o seu caso, terá sempre existido uma primeira vez! Já todos trocámos impressões com um praticante de trail superexperiente. Daqueles que têm sempre uma história improvável ou engraçada para contar, histórias que por vezes até lhe provocam uma boa dose de suores frios. No entanto, se pensarmos bem, não é necessário percorrer todos os trilhos do país para encontrar contadores de histórias. Todas as corridas têm o seu quinhão de surpresas, de encontros e de adrenalina. Afinal, todas as primeiras vezes são memoráveis...

A primeira noite 

Ainda consegue sentir toda a excitação que rodeou essa primeira noite. O dia em que, sentado em frente ao computador, clicou no botão inscrição depois de ler, na descrição da prova, que a partida seria dada à meia-noite em ponto na praça municipal. Sentindo-se tal e qual um guerreiro enfrentando o frio da noite, perigosamente cercado por hienas com os seus olhos amarelos trespassando a obscuridade, de dentes afiados, cortantes como... STOOOOP ! Coloque em pausa o anúncio do filme realizado (por si) em sua homenagem.

A partida foi de facto dada na praça municipal e o mais provável é que não estivesse preparado para o choque. Para a dificuldade. É uma experiência mágica. Do altifalante ouve-se a contagem decrescente e os fumos vermelhos abraçam a noite. Quase todos os habitantes da cidade ficaram acordados para vos ver partir, as crianças ainda não foram para a cama para vos gritarem palavras de encorajamento a partir das janelas dos seus quartos. *Esta passagem é ainda melhor do que o filme que imaginou*. O problema é que nunca pensou no abismo existente entre a euforia de toda esta agitação e a solidão que viria a sentir meia-hora mais tarde, embrenhado na escuridão da noite e tendo, como única aliada, a sua lanterna frontal.

Os primeiros cinquenta km

“Cinquenta km? Pffff*, fácil! Já participei numa corrida de trinta quilómetros. São apenas mais vinte. É canja! ”.

*Bem, eu uso esta espécie de grito interior, mas será que consigo passar da mesma maneira?


Ora bem, Cinquenta quilómetros não se percorrem de improviso, caro atleta. Mesmo após uma preparação rigorosa, ninguém pode dizer, ultrapassada a linha de chegada, que a prova decorreu exatamente como esperava. Alguns participantes sentem as pernas tremer logo no início da corrida. Outros sentem a famosa crise de fadiga muscular por volta do trigésimo quilómetro.
Os primeiros cinquenta marcos são, muitas vezes, uma revelação sobre si mesmo: o organismo fala e força-nos a ouvi-lo, cabendo-lhe sempre a última palavra, “Ok, não queres açúcar, já percebi”. Serão precisas várias outras corridas de cinquenta KM até descobrir o ALIMENTO satisfatório para si e para o seu corpo. Um verdadeiro trabalho de equipa. Os primeiros cinquenta km, e todos os outros, são uma lição de paciência, tal como o treino de um cãozinho desobediente. Para terminar a prova, é necessário saber antecipar e gerir o esforço ao longo do trajeto. Os primeiros cinquenta km são um patamar que é preciso saber conquistar. Geralmente, isso funciona bem, pois todos os que experimentam acabam por voltar!
Os seus primeiros cinquenta km constituem a primeira lição de humildade que o trail lhe dá. Na verdade, o trail é uma espécie de deus grego que volta a colocar o homem no seu lugar de mero mortal. Bolas, já deveria ter desconfiado! As aves que viu a sobrevoar o arco de partida eram, na verdade, o oráculo do deus do trail. Agora, tudo está claro. :)

A primeira dificuldade   

Estamos na Ultra Trail Puy Mary Aurillac ®, em junho de 2016. As condições meteorológicas são… As melhores possíveis! Vento forte, chuva intensa e frio. A juntar-se a isso, outro elemento crucial: temos 105 quilómetros e 5 500 metros de desnível positivo a percorrer. Nunca corri em média altitude, nem com bastões, nem uma tal distância. Sinto já um formigueiro nos pés e ainda nem comecei a corrida. Não é preciso fazer-lhe um desenho, não pretendo ensinar a missa ao padre. Sabe de que forma o desafio pode ser irresistível!

É dada a partida, quero correr em todas as cotas, erro básico. A minha lanterna frontal ilumina muito mal à minha frente, no entanto, coloquei-lhe pilhas novas antes de sair de casa. Uma chuva permanente e mais ou menos grossa abate-se sobre o meu feixe luminoso. A lama é espessa, pegajosa e prende-me os movimentos nas descidas. Os restantes participantes parecem querer dizer-me: “Quiseste armar-te em esperta, agora aprende”. Transida de frio, decido tirar as meias de contenção e enfiar nelas as mãos enregeladas. Estou no auge da minha beleza e forma física. Durante um reabastecimento, um voluntário interpela-me: “Quer desistir? ”. O meu rosto falou por mim. Imediatamente, liguei a minha luz intermitente e assim evitei um acidente. Continua no próximo parágrafo, suspense...!

A primeira desistência

Então, sorria, está tudo bem! A primeira desistência não é sinónimo do fim do mundo, acontece. Poderá viver outras experiências mais positivas, com chegadas à meta. Contrariamente à fanfarra que acompanhava o anúncio da partida onde se sentia um herói, uma desistência pode tornar-se um filme de terror onde o herói se transforma em vítima (dele mesmo, diga-se de passagem). Na sua cabeça, reproduz mil vezes os acontecimentos que marcaram a corrida. No final, chega sempre à mesma conclusão: talvez pudesse ter conseguido transpor a linha de chegada. É certo que, depois de tomar banho, de comer e de descansar, tudo parece mais fácil! Sim, de facto poderia ter concluído a corrida, se tivesse… E se não tivesse… E sobretudo, se pudesse voltar atrás e se... Mas a que preço? Como poderá tornar-se mais forte, reanalisar as suas opções, progredir, se nunca tentar fazê-lo? Não, não se arrependa de nada.

Não pense que é o praticante mais azarado que alguma vez tentou concluir a prova. Aproveite cada experiência, boa ou má, para retirar dela uma lição de resistência ao stress, para se tornar uma melhor versão de si mesmo : porque sabemos bem que são necessárias várias tentativas antes de o conseguir!

A primeira chegada

Já se ouvem as saudações e os aplausos. Já se sente o entusiasmo do final! Já se veem os avós sentados nos bancos. Lançam as habituais palavras de encorajamento, “força, está quase! Só faltam dois quilómetros”. Dois quilómetros apenas! A libertação. Começa a pensar que afinal até passou depressa. Ufa! Bom, mas onde está essa maldita linha de chegada?

Aqui vai uma segunda lição para não esquecer: nunca acredite nas estimativas quilométricas dos apoiantes. NUNCA. As suas palavras são suas inimigas. São como o canto das sereias que embalam os incautos com ilusões e os atraem para a negritude profunda da irritabilidade, após sete horas de corrida. Quando estas criaturas fantásticas lhe anunciarem um número, tape os ouvidos. Bem tapadinhos. Não faltavam apenas dois quilómetros, mas cinco.

Coloca o rancor de parte quando, desta vez, se apercebe claramente de que a chegada já não é uma miragem: o som, a vida! A entrega. Sente-se fresco como uma alface, pronto a mergulhar com as sereias. As pernas estão leves, as bolhas desaparecem.

O quê, já acabou? Tem vontade de ir buscar os avós sentados num banco a dois quilómetros da chegada... perdão, cinco! Gostaria de apresentá-los ao comité de organização da corrida: no próximo ano, a corrida deveria ser prolongada por mais dez quilómetros, pelo menos! Não, estou a brincar.

O orador felicita-o! Acaba mesmo por dizer uma palavrinha ao microfone, enfim quatro, “correu tudo muito bem! ”. Um voluntário coloca-lhe uma medalha ao pescoço. Junta-se rapidamente ao seu companheiro de corrida, o João. Já sonha com o pão com marmelada!

A primeira amizade que se faz numa corrida

Fala-se no lobo: e aparece o primeiro companheiro de corrida, João. Para enquadrarmos a sua história, resumimos o vosso encontro com alguns números, ou seja:

 

Um encontro ao quilómetro treze.

O João vê-o vomitar no quilómetro trinta e cinco (uma tal experiência acaba forçosamente por criar laços).

Ajuda o João a levantar-se após ter bebido ao quilómetro quarenta e dois (dito assim, a prova parece um sonho).

O seu namorado dá-lhe um doce ao quilómetro quarenta e cinco (também ele o aprovou).

Cinquenta quilómetros para fazer dele um amigo para a vida toda.

 

As amizades feitas durante uma corrida têm a vantagem de ir direto ao essencial. Os falsos elogios, as delicadezas inúteis e outras perdas de tempo não têm razão de ser. Simultaneamente exaustos pelo esforço e maravilhados pela situação em que se encontram, renunciam às frivolidades e aos filtros. As máscaras caem por terra e são pisadas. O seu novo amigo abre-lhe a porta da sua vida.E passa também a conhecer a sua.

Estas poucas linhas são, por isso, um louvor a todos os companheiros de corrida! E por vezes, mesmo àqueles a quem, só na linha de chegada, às vezes já durante o duche coletivo*, perguntamos “mas afinal como te chamas? ”.

 

*Não é este o seu caso e o do João. Falámos em duches coletivos, não duches mistos!

As primeiras fraquezas (e não serão as últimas...)

Todos nós já fomos assolados pelo mesmo sentimento. Em declive, com os músculos a arder. Ou evoluindo dificilmente contra um vento forte e uma chuva intensa. “É a última vez! Nunca mais.”. É evidente que, em plena dificuldade, seria estranho dizer “adoro este momento, gostaria que durasse para sempre”. Felizmente, como bom praticante que é, não sente qualquer vontade de desistir da corrida. Imediatamente após a chegada, ainda envolto pelo entusiasmo e imerso nos clamores dos seus apoiantes, já só tem uma ideia na cabeça: recomeçar!

E por falar dos seus apoiantes, quer desesperadamente causar-lhes uma boa impressão. Mas, com tanta vontade de fazer tudo bem, acabou por se esquecer de que para passar da resistência do aço à fragilidade da flor, basta um passo. Sorri-lhes e sente vontade de os abraçar. E, no segundo seguinte, parece que vai derramar todas as lágrimas que transporta no corpo. Resumindo, sente que a prova mudou algo em si. A menos que nunca se tenha sentido tão verdadeiro consigo mesmo como agora....

Aparentemente, o seu círculo de apoiantes é também o seu calcanhar de Aquiles. Ao longo da prova, nos momentos mais difíceis, começam a surgir fendas na sua carapaça. Não há qualquer problema em deixar cair a máscara em frente ao seu companheiro João, que está na mesma situação. Mas retirá-la em frente a uma família protetora e afetuosa é mais difícil de aceitar.

No entanto, no momento em que transpõe o arco de chegada, a constatação é sempre a mesma: apercebe-se dos momentos sagrados que acabou de partilhar com todos eles e acaba por querer mais, cada vez mais!

Independentemente do número de vezes que participar em corridas, nunca será capaz de antecipar as seguintes! Cada prova de trail é única, mesmo aquelas que contam com a sua participação há séculos. Quantas vezes se ouviu dizer à chegada “não vais acreditar no que me aconteceu!”? E nós queremos ouvir e saber o que se passou de tão especial, para que possa recordá-lo para sempre.

AS GRANDES ETAPAS DA EVOLUÇÃO EM TRAIL

Manon

Filha, irmã e companheira de ciclistas. Praticante de trail* aclamada desde a escola de desporto. Nível Ultra* em aquisição. Maratonista e campeã nos 10 000 metros de marcha atlética da France Junior 2013. Apaixonada por histórias de desportistas.

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