Formado em engenharia química, François Gourmet participou em dois campeonatos europeus e um mundial. Durante a sua carreira profissional, poderia ter ocorrido uma reconversão para longe do tartan das pistas de atletismo. Mas a paixão pelo desporto nunca esmoreceu, nem depois de se ter afastado da alta competição, em 2012. Hoje, é com felicidade que partilha o seu tempo entre o papel de treinador no clube de atletismo de Seraing e em Waremme (Bélgica) e um trabalho em tempo parcial na Decathlon de Alleur. Sempre próximo de um desporto que continua a consumir sem moderação.
Atualmente, o ex-decatleta François Gourmet, para além do seu trabalho na Decathlon de Alleur, reconverteu-se em treinador.
Encontrámo-lo na pista de Waremme, onde partilhou connosco a sua visão do atletismo e da formação.
François Gourmet encontra-se no seu elemento, na pista de atletismo do clube de Waremme (Waco). Apesar do tempo caprichoso, o prazer de treinar está estampado no rosto do ex-decatleta, campeão da Bélgica em 2005. «Adoro ver a alegria e os progressos das crianças! ».
«Tornei-me polivalente ao nível do desporto. Da bicicleta, que pratiquei para a B'TWIN durante três anos após a minha carreira de decatleta, ao halterofilismo, passando pela corrida ou o triatlo... Sinto necessidade de me manter ativo, ao sabor dos meus desejos e objetivos. Pois adoro o desporto, preciso dele. E não me imagino com mais dez quilos em cima. »
O treinador, doravante à cabeça da Equipa Gourmet, nunca considerou a possibilidade de deixar um meio no qual é feliz desde criança.
«Tive a oportunidade de entrar diretamente para a Decathlon, primeiro em Liège e depois em Alleur. Em paralelo, desenvolvi as minhas atividades como treinador, acompanhando nomeadamente Robin Vanderbemden e, agora,Julien Watrin e outros atletas, com idades entre os 14 e os 30 anos. »
Mais do ninguém, aquele que considera que a prática intensiva do atletismo durante a idade escolar lhe permitiu «organizar melhor o seu tempo» pode julgar os benefícios da disciplina para o desenvolvimento, tanto físico como mental, da jovem geração. Encontro.
O atletismo está, na minha opinião, na base de todos os desportos. Por exemplo, quem quiser jogar futebol terá uma grande vantagem se já dominar a corrida. E quem quiser jogar vólei, terá muito a ganhar se praticar atletismo, pois irá desenvolver a impulsão graças aos saltos.
Em geral, as crianças que praticam atletismo experimentam tudo, o que lhes permite aprender a lançar, saltar, correr depressa ou durante muito tempo. Eu aconselho às crianças que praticam outros desportos que, em paralelo, façam atletismo uma vez por semana: terão tudo a ganhar, ao desenvolveram simultaneamente a sua resistência, velocidade e coordenação.
Humanamente, é ainda um desporto que permite desenvolver o caráter e a força mental. Independentemente das condições, como no cross de inverno, é preciso dar tudo por tudo. E se se tratar de um desporto individual, o facto de pertencer a um clube, com os encontros interclubes, permite aprender a viver e a trabalhar em grupo segundo os valores de entreajuda.
A diferença é que, no atletismo, as vitórias podem tomar outras formas. E isso é fantástico para as crianças. Pouco importa o seu nível, cada um compete, antes de mais, consigo mesmo.
Graças aos tempos e aos números, podemos ser os últimos e ainda assim batermos o nosso recorde. E isso basta para sentirmos satisfação, enquanto noutras disciplinas só a vitória interessa. Cada um progride e avança ao seu ritmo, os adversários não importam.
Até aos 14 anos, é essencial uma prática multidisciplinar. E isto não tem nada a ver com o meu passado, é um princípio geral que toda a gente partilha. O objetivo é mesmo desenvolver ao máximo todas as capacidades da criança, antes de escolher uma ou várias disciplinas favoritas.
É um elemento fundamental da formação que, no entanto, pode ser difícil de fazer compreender aos pais e às crianças, que preferem procurar o êxito desde a mais tenra idade nas disciplinas que pensam dominar melhor. Mas, até Nafi Thiam praticou cross, embora não fosse bem a sua praia. Não voltaremos a vê-la praticar cross, mas a sua passagem pelos trilhos certamente que contribuiu para a sua construção enquanto atleta de alto nível.
Além disso, há sempre um risco na especialização. Um jovem que se dedica, desde cedo, exclusivamente à altura, ao sprint ou aos saltos terá mais depressa problemas físicos. Não é aconselhável repetir movimentos específicos desde muito jovem. Pelo contrário, experimentar de tudo é bom para o desenvolvimento geral do corpo do atleta.
É preciso não fechar os olhos. Somos naturalmente orientados para a disciplina em que somos proporcionalmente os melhores, o que em geral está associado à morfologia da criança. Todos os atletas gostam de ganhar ou, pelo menos, aproximar-se da vitória. Pessoalmente, se eu tivesse sido um bom sprinter, não teria enveredado pelas disciplinas múltiplas. Mas eu não tinha o nível para sonhar com um campeonato europeu ou mundial, como tive no decatlo.
Enfim, esta constatação aplica-se principalmente àqueles com o melhor desempenho. Para os restantes, o aspeto da camaradagem também tem um papel importante. É frequente ver-se um grupo de jovens que se mantém junto até aos 16 ou 18 anos, por causa do ambiente fenomenal. O atletismo também é, sobretudo, prazer e bons encontros. E não se deve negligenciar este aspeto.
A individualização! É algo que me faltou por vezes, durante a minha carreira. Cada criança, ou atleta, tem necessidades diferentes e merece que o seu treinador o escute. Não existe nenhuma fórmula mágica ligada a uma disciplina.
Cada um, em função das suas características, seguirá um caminho diferente para atingir o máximo das suas capacidades. É importante que o atleta tenha confiança no que lhe é pedido e se sinta compreendido. O treinador quase faz um trabalho de psicólogo (risos). São princípios que, enquanto treinador, tento aplicar diariamente.
O atletismo é um desporto exigente onde, a longo prazo, não basta o talento.
«No atletismo dependemos apenas de nós próprios. Cada resultado positivo que obtemos é resultado de um investimento de vários anos, insiste François Gourmet. Não é possível fazer batota.
Se nos prepararmos bem, estaremos no melhor da nossa forma no dia da competição. Se não for o caso, porque não dormimos o suficiente, fizemos muitos desvios ou não respeitámos o plano de treino, isso irá refletir-se no desempenho. Os atletas de qualquer idade sabem-no e é por isso que, muitas vezes, são mais rigorosos do que nas disciplinas coletivas, onde podem contar com os colegas de equipa.